Ponto prévio: não sou licenciado em Direito. De tal matéria, ressalvo desde já, nada percebo. Agradeço por isso ao "Ciberdúvidas" o ter-me enviado os comentários de ilustres jurisconsultos (em linha como contraponto desta controvérsia) e a maneira delicada e compreensiva como tais comentários foram apresentados.
A língua, ou talvez melhor, a Língua não tem fronteiras de assuntos. Ela está em todas as actividades. É impossível abrangê-la. Por isso, estou muito grato pelas informações esclarecedoras que recebi. Bem hajam, pois.
Vamos, então ao assunto:
1 - Na minha colaboração com o "Ciberdúvidas" no que respeita à Língua Portuguesa, não devo nem quero agir fora do que se encontra estabelecido, quer pela lei, quer pelo consenso geral. Se eu não seguir este caminho, gera-se uma tal confusão que ninguém se entende.
2 - Foi por isto que dei a tal resposta sobre em sede de.... E, por ora, não vejo outra, uma vez que, de maneira geral, o sentido de sede é o de lugar - o lugar onde se pode estar ou o lugar destinado a determinados serviços. Não parece, pois, que na expressão "em sede de revisão constitucional", se aluda a um lugar destinado ao trabalho de "revisão constitucional". E se houver esse lugar, o correcto é dizer-se "na sede de/da", porque a palavra "sede", em frases como estas, exige o artigo definido a. Não tenho de que a Língua Portuguesa seja assim. Não fui eu que a fiz, fomos todos nós - o povo português.
3 - Nas minhas respostas, não devo nem quero afastar-me do que li, estudei e aprendi, e do que leio, estudo e aprendo, tal como faz o advogado,o juiz, o médico, o físico, etc. Não há, porém, estudo tão vasto como o da Língua Portuguesa, para nós do lado de cá do Atlântico, e para os Brasileiros, do lado de lá, porque não tem fronteiras de assuntos. Está presente em todas as nossas actividades - até nas actividades puramente intelectuais. Ela até está presente no que não existe, porque também falamos e escrevemos sobre o que não existe.
As dificuldades de quem estuda a Língua Portuguesa são tais, que quem dela se ocupa não se pode isolar. Muitas vezes, precisa de conversar com o advogado, com o médico, com o pintor… e não raro com os analfabetos.
Em questões de Língua Portuguesa, não devo nem quero afastar-me daquilo que ensina o dicionário geral (há vários), a não ser em casos muitos especiais. Mas além deste, há os dicionários específicos: os do direito, da medicina, da biologia, da literatura, etc. E agora peço auxílio aos juristas: existe algum dicionário da linguagem do direito que esclareça o caso da expressão em sede de…? Se sim, é possível que a dificuldade esteja resolvida.
4 - Vou agora responder sucintamente a cada um dos meus insignes comentadores. É natural que erre, porque sou completamente alheio aos assuntos do vastíssimo e complicado direito. (Eu queria escrever "Direito", mas as normas ortográficas não me dão licença). E se errar, ficarei imensamente agradecido por qualquer esclarecimento com base científica. Não posso trabalhar sem a ajuda dos outros e sem respeitar o saber alheio.
5 - Diz APR:
a) Em sede de… pertence à linguagem jurídica (…)"". Em que estudos sobre esta expressão me posso eu basear?
b) "Para mim, em sede de significa 'em o', 'no', 'na' (…)". Em questões de língua, não há verdadeiramente o "para mim" nem "o para ti". Há o que a língua é e o que ela não é.
6 - Diz António Freitas:
"Se 'em sede de' deve ser banido devido à origem estrangeira, quantos modismos e idiotismos não deveriam seguir o mesmo caminho?" Mas eu nunca disse que "em sede de" é de origem estrangeira. Nem sei mesmo se é ou não. Os juristas sabem melhor isto do que eu.
7 - Diz Luís Moreira:
Referindo-se a mim: "(José Neves Henriques) alega que o presumivelmente dispensável 'em sede de revisão' é o mesmo que 'na revisão'. Eu não disse que "é o mesmo que". Disse, sim, que "'em sede de revisão' não é aceitável". E que o correcto será "na revisão". É tudo uma questão de correcção ou não correcção de linguagem. Quanto ao sentido, é com os juristas. Eles é que sabem.
8 - Diz José Ribeiro:
"Em sede de revisão não será mais específico que na revisão?" A isto não posso responder, assim como às outras observações, porque é assunto de quem se ocupa da matéria do direito. A minha área é outra: é a da língua e a da linguagem; e não aquilo que esta me transmite. Daquilo que ela me transmite, apenas me sirvo para estudar a linguagem e a língua, assim como de outros saberes, tal é a psicologia e a lógica.
9 - Diz JL:
"Peço desculpa, mas em 'sede de revisão', para os juristas, tem um sentido mais restrito do que 'na revisão'".
Desconhecia esta diferença de sentido; por isso fico muito grato pela informação. Desconhecia também todas as informações que a segiur me dá, entre elas a de que "em sede de" é uma expressão internacional. A dúvida é se, também nesses exemplos lá fora, "sede" é a mesma palavra que a nossa "sede", a significar "lugar". Tal como, por exemplo, "canto" é a mesma palavra em "canto da sala" diferente de "eu canto o fado".
Parece-me que ninguém, melhor que os juristas, pode ajudar a Língua Portuguesa neste particular, porque são eles que mais contacto têm com a bibliografia estrangeira do direito. Na expressão "em sede de", podemos estar em presença de "sede" /séde/ ou de "sede" /sêde/ ou dum neologismo. Alguns textos doutras línguas, em que também se mostre a respectiva situação, poderão contribuir para a solução do nosso problema.
Volto a insistir: está bem clara a necessidade de quem estuda a Língua, de se abeirar das pessoas que se ocupam doutros saberes.
10 - Quanto ao que escreve a prezada consulente Catarina Nunes digo o seguinte:
a) Não sou gramático nem o desejo ser. Apenas me sirvo da gramática como auxiliar para estudar, compreender, usar e explicar a Língua Portuguesa e também para aprender as outras.
b) Não rejeitei "o jurídico 'em sede de'".
Não tenho competência para tal, porque não sou jurista. Apenas rejeitei a sintaxe dessa expressão. A Língua é como é e não como muitas vezes gostaríamos que (não) fosse...
c) Não neguei, como afirma, "um recurso legítimo, no caso aos juristas" e nem " por extensão a todos os sectores profissionais e que é o terem, para melhor e mais profundamente se entenderem, uma linguagem própria". Todos sabemos, até os analfabetos inteligentes, que cada "sector profissional" tem "uma linguagem própria". Eu apenas me referi à incorrecção de linguagem da locução "em sede de", e não à linguagem específica do direito.
d) Não percebo a sua expressão "elementos estruturantes" em " (…) os códigos linguísticos profissionais não geram um só um léxico específico, mas também 'elementos estruturantes' mais ou menos perceptíveis como a locução "em sede de" entre os juristas (…)".
A palavra "estruturante" significa "que estrutura", isto é, "que organiza a estrutura". Está bem de ver que esses "elementos" não têm o poder de "organizar", porque só o homem o tem.
e) Se a expressão "em sede de" é um estrangeirismo incontornável na linguagem do direito", é necessário investigar nos outros idiomas.
Apenas um exemplo já atrás referido:
A palavra (ou palavras) doutros idiomas corresponde à nossa palavra "sede" /séde/ ou à nossa palavra "sede" /sêde/ ou a outra? Ou não há verdadeiramente palavra em português e portanto, "em sede de" é apenas adaptação, que pode ser ou não aceitável?
f) Daqui se conclui que o caso precisa de investigação, pelo menos parece, e ninguém melhor que os juristas a poderá fazer, porque somente eles se encontram dentro das "coisas" do direito para se levar a cabo esta questão, de maneira que "em sede de" deixe de ser 'um estrangeirismo incontornável na linguagem do direito". Sim … como se exprimiam então os juristas anteriormente naquelas situações em que hoje empreguam "em sede de"? Ou não surgiam tais situações?
Tudo que fica escrito não foi para defesa minha, mas apenas para esclarecimento. Se nalguma coisa errei, peço duas coisas:
a) Que me desculpem os meus críticos
b) Que me elucidem, se é que há tempo para isso.