Obrigadíssimo, antes de tudo, pela resposta, divulgada no dia 13/3/98, à pergunta que formulei sob o título "Este, esse: qual a diferença?" Aprendi, com a lição, que o emprego do demonstrativo depende exclusivamente do grau de proximidade do objeto a que se faz referência. A questão é: serão esses pronomes assim tão servis à noção de lugar? Na verdade, o que se verifica é justamente o oposto: não existe, na língua portuguesa, pronome mais elástico do que o demonstrativo. O Aurélio contém um exemplo, no verbete «Este», no qual Herculano aplica, a um mesmo objeto imóvel, os vocábulos «este» e «aquele» — muito embora o aludido objeto esteja textual e contextualmente "aí", o que deveria pressupor o emprego de «esse».
Atenho-me, contudo, ao problema que lhes propus. «Escrevo para este 'site'" (ou «página», como queiram)» ou «Escrevo para esse 'site'»? A solução que me ofereceram não me deixa convencido de sua justeza. Afirmam os senhores:
«(...) a maneira correta de construir a frase apresentada pelo nosso consulente só pode ser esta: 'Escrevo para essa página' (='site'). O nosso consulente (o emissor) dirige-se ao pessoal de Ciberdúvidas (receptor) junto do qual está a referida página, isto é, essa página.»
Está claro que, ao excluir a possibilidade »Escrevo para esta página (='site')», não consideraram que utilizo, para escrever, a mesma página em que estarão os senhores a responder-me. Vejo que prestaram demasiada atenção à relação que existe entre o emissor (que sou eu) e o receptor (que são os senhores); e não levaram em conta que o suporte das minhas palavras e das suas palavras é rigorosamente um só: esta página. Dirão: em tal caso, teria sido preferível grafar «Escrevo nesta página» e não «Escrevo para esta página». Concordo, mas replicarei que, ao escrever neste página, dirigi-me não apenas aos senhores mas também a uma comunidade — porque «página», no sentido que os senhores lhe emprestaram, pretende ser uma tradução de "site", "locus", ou seja, uma espécie de praça pública virtual à qual centenas de milhares de pessoas acedem, de todos os continentes, em busca do prazer proporcionado por uma melhores opções da "web" em matéria de língua portuguesa. Nessa acepção, portanto, escrevo «para», e não «nesta» página (é claro que devo evitar a prolixidade de «Escrevo nesta página para essa página.»).
Do que precede, faço duas ilações. Primeira: a palavra «página» não é tradução feliz de "site" («sítio» não lhes pareceria mais natural?) Segunda: a Internet nos impõe, além da realidade virtual, a criação de uma nova figura gramatical: o pronome demonstrativo virtual. Suas características são a ambigüidade, a abrangência planetária da interlocução, a eliminação da noção de proximidade que tradicionalmente orienta o uso dos demonstrativos etc.
Cf. «...para esta página»= «…para essa página» + «A Língua Portuguesa, o este e o esse».