Língua Mater Dolorosa - Antologia - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
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Língua Mater Dolorosa


Tu que foste do Lácio a flor do pinho
dos trovadores a leda a bem-talhada
de oito séculos a cal o pão e o vinho
de Luís Vaz a chama joalhada

tu o casulo o vaso o ventre o ninho
e que sôbolos rios pendurada
foste a harpa lunar do peregrino
tu que depois de ti não há mais nada,

eis-te bobo da corja coribântica:
a canalha apedreja-te a semântica
e os teus verbos feridos vão de maca.

Já na glote és cascalho és malho és míngua,
de brisa barco e bronze foste a língua;
língua serás ainda... mas de vaca.

 

Fonte
Poema publicado pela primeira vez no livro "Inéditos", 1973-76, e que integra a antologia de toda a poesia de Natália Correia, "O Sol nas Noites e o Luar nos Dias", 2º volume, Projornal, Lisboa.

Sobre a autora

Natália Correia (Fajã de Baixo, 1923 – Lisboa, 1993) foi uma intelectual, ativista e escritora conceituada. A sua ação enquanto ativista passou pela defesa do património, dos direitos humanos, das mulheres e da cultura, onde, juntamente com José Saramago e outros conceituados escritores fundou a Frente Nacional para a Defesa da Cultura (FNDC). Enquanto escritora a sua obra estende-se por géneros variados, desde romances infantis passando por romances, viagens, teatro até à poesia, género pelo qual é reconhecida, destacando-se aqui Rio de Nuvens, 1947, O Dilúvio e a Pomba, 1979, O Armistício, 1985, entre outros.