«Por isso é que tem este princípio: se se pronuncia, fica, se não se pronuncia, corta-se», afirma à Agência Lusa o investigador convidado do Centro de Investigação em Educação da Universidade do Minho e investigador jubilado da Associação Piaget Internacional, que sábado profere em Coimbra a comunicação Acordo Ortográfico: SOS pelas matrizes profundas da Língua Portuguesa.
Fernando Paulo Baptista considera que o mais grave que o presente acordo comporta é na Base IV, com as designadas sequências consonânticas, em especial nas ct e pt, opção que «vai liquidar aspetos importantíssimos da via erudita» da formação do vocabulário da língua portuguesa.
Afirma que, ao fazer um estudo pormenorizado da língua portuguesa antes do acordo e de cinco das línguas mais importantes no mundo, o inglês, espanhol, francês, italiano e alemão, concluiu que estas preservam a raiz nas mesmas palavras.
Encontra situações de «ditadura fonética», nomeadamente com verbo o latino ago, que deu o verbo agir, com «mais de quatrocentos vocábulos em língua portuguesa», e em expressões como atualidade e ação, actuality e action em inglês, ou actualité e action em francês.
«Isso vai dificultar o rigor que o uso escrito da língua deve ter, mesmo na criação poético-literária, na reflexão filosófica, nos grandes saberes da cultura e na linguagem especializada de todas as ciências», sustenta.
O filólogo encontra ainda «problemas graves» no quadro concetual e terminológico das ciências, em que «mais de 80% é de base greco-latina», e no ensino-aprendizagem do vocabulário nas escolas.
«O meu SOS é para chamar à atenção para o empobrecimento enorme que a língua portuguesa vai ter, mesmo para o Brasil, por ser o país que tem mais população. Vai perder a qualidade competitiva e sobretudo dialogal, dialógica, com as outras línguas que mantêm a raiz [latina]», acentua.
Na sua perspetiva, «sacrificar a via erudita é sacrificar o próprio ideal de erudição, de cultura mais elaborada, da expressão mais rigorosa» da língua.
«É a expressão da anarquia total. Não tem coerência nenhuma. Quer unificar, mas não unifica» e «assenta em erros gravíssimos», sustenta, reportando-se ainda a abolições de "hífen", duplas acentuações e de pronúncias.
Fernando Paulo Baptista observa porque não caíram por exemplo os h e u que não se pronunciam, quando «se utilizou a oralidade para fazer a regulamentação» ortográfica.
in "Jornal de Notícias" do dia 16 de março de 2012