Depois do artigo absolutamente devastador de João Andrade Peres, no “Expresso” de 8-12-2006 (em versão bastante mais desenvolvida no site http://jperes.no.sapo.pt) e das fortíssimas intervenções de Jorge Morais Barbosa (de quem espero seja entretanto publicado um artigo muito importante, cujo original conheço por gentileza do autor), aos não linguistas pouco resta a fazer nesta fase do malfadado processo da TLEBS.
Na verdade, eles fizeram o que lhes competia: chamaram a atenção para a gravidade do problema, insistiram na denúncia de vícios e falhas cuja detecção estava ao seu alcance, pronunciaram-se como cidadãos e pessoas ligadas à cultura sobre os aspectos calamitosos que, em sua opinião, se prenunciavam.
Isto não os livrou de serem apodados de «reaccionários» por uma dama, ela sim, tão «progressista» que só mostrou saber lançar mão do argumento de autoridade em termos acríticos, do tipo «façam o favor de estar calados porque isto só diz respeito a quem sabe e quem sabe são os linguistas». Sibi imputet e que o doutoramento a que se candidata lhe pese tão pouco quanto a exígua bagagem de que dá provas. Mas seja-lhe lembrado, recorrendo a uma terminologia galinácea que deve estar ao alcance do seu entendimento, que mesmo quem não seja capaz de pôr ovos pode ter boas razões para achar que um ovo está estragado e é impróprio para consumo...
Há só dois pontos que devem ainda ser abordados.
1. A TLEBS é só a lista que consta do anexo da Portaria n.º 1488/2004 e faz parte integrante dela (art. 1. º).
A alínea a) do art. 6.º do mesmo diploma diz competir à Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular «promover a divulgação da TLEBS, sob a forma de base de dados, pelo meio mais adequado (...)».
Sendo assim, é forçoso entender-se que a TLEBS, sob a forma de base de dados, é idêntica à TLEBS em “Diário da República”. Não se pode considerar que tenha força normativa o que figure na base de dados mas não se encontre na portaria.
Se a portaria em questão não incorpora nenhuma base de dados de definições, esta poderá existir para fins de formação e esclarecimento dos professores, mas não integra o quadro jurídico criado. De outro modo, a situação seria geradora de inúmeras incertezas e não de um mínimo de segurança jurídica.
Mas justifica-se perfeitamente que as análises de Andrade Peres e de Morais Barbosa sejam feitas sobre o conjunto formado pela lista de termos e pela base de definições. Trata-se de intervenções científicas que, enquanto tal, não podem deixar de considerar, na íntegra, et pour cause!, o corpus impingido em todas as suas modalidades aos professores.
2. O trabalho que culminou na TLEBS atravessou vários Governos. Começou há nove anos, num Governo PS, prosseguiu noutro Governo PS, passou por dois Governos PSD, e está agora, como batata escaldante, outra vez nas mãos de um Governo PS.
Nenhum dos responsáveis da pasta da Educação, ao longo desse tempo, é da área da Linguística. Foram estruturas do ministério que validaram os resultados, prepararam o normativo a publicar e persuadiram os governantes das excelências da solução. E como qualquer governante deve confiar, à partida, na qualidade dos serviços que tutela e na capacidade dos seus altos funcionários, a responsabilidade pelo sucedido só formalmente pode ser imputada a membros do Governo.
A verdadeira responsabilidade é de quem os induziu à aprovação de uma grotesca pantomina desconchavada, de cuja real dimensão só nos apercebemos mais profundamente graças aos contributos, não apenas autorizados ex cathedra, mas também explicitados com toda a clareza, que comecei por referir.
Isto quer dizer uma coisa, Senhora Ministra: Esta gente não serve! Não serve se está de boa-fé e se limita a exercitar, sem preparação e sem tino, as limitações da sua própria incompetência e, por maioria de razão, não serve se está de má-fé e age obedecendo a propósitos inconfessáveis, sejam eles pretensamente científicos ou quaisquer outros.
Concluindo, e quanto ao que há a fazer no plano da política educativa, João Andrade Peres traça o melhor caminho: suspender imediatamente a aplicação da TLEBS, nomear já uma comissão de peritos, manter em vigor a Nomenclatura Gramatical Portuguesa de 1967 no que corresponde à parte deficiente daquela (se é que dela se salva alguma coisa), ter a coragem de fazer tudo isto e de não perder mais tempo.
A TLEBS implodiu. Agora, é urgente uma solução séria.
Artigo publicado no "Diário de Notícias" de 13 de Dezembro de 2006.