Um caso de eponímia generalizado nos usos do português em Angola, descrito nesta crónica do autor, publicada no semanário "Nova Gazeta", do dia 30/04/2015.
Várias medidas já foram tomadas para se tentar erradicar o paludismo [ou] malária. Passaram-se décadas, mas tudo continua e a doença conseguiu conquistar o primeiro lugar entre as principais causas de morte em Angola, estando à frente apenas da sinistralidade rodoviária.
De acordo com um analista em declarações à Rádio Ecclésia, o paludismo [ou] a malária devem ser atacados pela raiz: os charcos de água que se transformam em autênticos viveiros dos agentes causadores dessa doença – o mosquito Anophele.
E eu concordo plenamente. É sempre melhor apostar na prevenção. De nada servem as importações de medicamentos contra o paludismo, quando o verdadeiro ‘inimigo’, tem todas as condições criadas para reproduzir-se a seu bel-prazer.
Os milhões que se gastam nos Coartem, Arinates e noutros antipalúdicos podiam muito bem ser investidos em campanhas de limpeza dos bairros, eliminar as águas paradas, na educação e sensibilização das famílias... «Assim – como dizia o analista –, não teremos mais necessidade de comprar shelltox».
Aliás, muitas dessas famílias afectadas pelo paludismo não têm condições para comprar o shelltox, que eu duvido que ainda se consiga encontrar nos nossos (super) mercados. Shelltox é/foi uma marca de um insecticida muito usado em Angola. Era um dos poucos que o país tinha. E muito provavelmente por isso é que o produto – o insecticida – passou a ser mais conhecido pela sua marca. E hoje, mesmo as pessoas mais avisadas ainda usam shelltox no lugar de insecticida.
Às vezes, até chegamos a pedir, nos supermercados, várias marcas de ‘shelltox’. Tudo aconteceu por influência do contexto, que também nos levou a usar gilete – marca de uma lâmina de barbear – e o pepsodent – marca de uma pasta de dentes.
Hoje, em Angola, quando falamos de shelltox ou de pepsodent não estamos a publicitar nada, pois esses dois elementos, e tantos outros, já fazem parte do nosso dia-a-dia. São ‘cidadãos’ bem conhecidos em quase toda Angola.
Para eliminarmos os mosquitos das nossas casas, além de outras medidas preventivas, não temos de necessariamente usar o ‘shelltox’, porque esta marca pode estar escassa. Podemos recorrer a outros tipos de insecticida disponíveis nos supermercados.
Crónica publicada no semanário luandense "Nova Gazeta", no dia 30 de abril de 2015, na coluna do autor, "Professor Ferrão". Manteve-se a grafia anterior ao Acordo Ortográfico, seguida ainda em Angola.