A «intragável» proliferação de programas de culinária na televisão portuguesa é pretexto desta receita no dialeto caipira, reproduzida nesta crónica do jornalista Wilton Fonseca, na sua coluna semanal do jornal "i" de 1/05/2014.
É sabido: a indigestão provocada pelos programas de televisão [em Portugal] dedicados à "culinária" desencadeou uma espécie de vómito universal. O intragável fenómeno tem tudo a ver com a irresponsabilidade, o narcisismo, o mercantilismo e o conservadorismo, é patrocinado por grandes interesses económicos e percorre o mundo pela mão (boca) de "chefes" e "especialistas" de duvidoso nível cultural.
O planalto central do Brasil não podia escapar à pandemia. A gastronomia local pouco vai além da carne de vaca, do leite, da mandioca e do feijão, mas quem chega à próspera Goiânia (dois milhões de habitantes) pode pensar que está em Paris. Foi ali que recolhi uma receita «casêra» de «repôi nu ái i ói» (repolho no alho e óleo), em dialecto caipira, que aqui reproduzo.
«Ingridienti: cinco dent de ái, treis cuié di ói, uma cabêss de repôi, uma cuié de mastumati (massa de tomate), sá agosto (sal a gosto). Modifazê: casca o ái, pica o ái i soca o ái cum sá, quenta o ói na cassarola, fóga o ái socado no ói quentim, pica o repôi beem finim, foga o repôi no ói quentim junto com o ái fogado, pô a mastumati i mexi cum cuié pra fazê o môi. Servir cum rôis.»
Simples, porém «bão dimais da conta!», diria um caipira.
O caipira é o dialecto mais falado no Brasil, do Paraná a Goiás, do Rio de Janeiro a Mato Grosso. Conjuga os verbos de maneira muito particular. Por exemplo, o presente do indicativo do verbo ser: eu sô, ele é, nóis é, eles é, ocês são (ou ocês é). Na prática, “eu” e o mundo. Actualíssimo.