Não estou a fazer nem a apologia nem a condenação do calão. Ele faz parte da língua. Aliás, ele faz parte da riqueza e da expressividade da língua.
Quem nunca se socorreu do calão no momento certo, atire a primeira pedra!
Há até subterfúgios para o utilizar – melhor dizendo, sugerir – em locais inapropriados para o seu uso. «Diga arroz, que também tem dois erres», costumava ouvir-se na emergência de uma situação em que o calão se justificaria como válvula de escape. Ou fogo!, interjeição agora tão utilizada pelos alunos – «chamam-se os bombeiros» – responderá algum professor de forma benevolente, numa admoestação leve…
O Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa até apadrinhou um recente (na nossa língua) termo de calão – bué – que já se vai ouvindo nos adultos, então, há que imitar os jovens!
Paradoxalmente, um outro termo de calão bem arreigado em Portugal, bicha, está em vias de desaparecimento, por mero preconceito. É que bicha, em português do Brasil, é sinónimo de homossexual (maricas, em calão). E os lábios finos e castos dos portugueses já não se atrevem a pronunciar a expressiva palavra bicha, quando se referem àquela situação que, pelo seu movimento e forma, faz lembrar uma bicha, uma serpente. Agora diz-se «Que grande fila!» em vez de «Que grande bicha!»; «Há muita fila…»
As pessoas já não vão para a bicha, vão para a fila… Estamos todos na fila, muito compostos e certinhos…
Em defesa deste animal em vias de extinção, outras vozes já se têm levantado. Felizmente, o que só me dá confiança para juntar também a minha…