Em qualquer língua, serão certamente detetáveis diferenças (algumas até bastante vincadas) entre contextos escritos e orais. Na língua portuguesa, escrevemos, por exemplo, menino, mas podemos dizer mnino, ou, no caso do português do Brasil, minino; escrevemos para, mas podemos dizer p’ra. O que não podemos é, como é evidente, confundir os referidos contextos, e passarmos, por acharmos que a oralidade valida a escrita, a escrever, por exemplo, mnino e p’ra.
Vêm estas considerações a propósito do curioso e perigoso nome de um programa de entretenimento de enormes audiências, produzido pelo canal português SIC, intitulado «Tás aqui tás apanhado». Ora, estamos justamente aqui perante um desses exemplos paradigmáticos, capaz de pôr em pé os cabelos de qualquer professor de Língua Portuguesa, pois este é um daqueles casos em que os nossos alunos mais tropeçam, sendo que a frase «o verbo ‘tar’ não existe!» deverá ser das que mais se fazem diariamente ouvir nas nossas salas de aula, apesar de haver, no vasto universo cibernético, quem jure a pés juntos que o mesmo existe, recorrendo até a insondáveis gramáticas, de inauditos gramáticos, que validam tal douta conclusão.
A partir de agora, têm os nossos alunos mais uma temível arma, validada pelo deus da comunicação social portuguesa, para argumentar com o professor, de maneira esclarecida e comprovada.
De facto, enquanto não começarmos todos a remar para o mesmo lado, e continuarmos a discutir, de forma descabelada, pormenores (para não usar a vernácula expressão com que um dos nossos ex-ministros das finanças nos brindou ainda muito recentemente) – leia-se acordos ortográficos e afins -, dificilmente chegaremos ao âmago das verdadeiras questões que corroem, dia após dia, a já por si fragilizada língua portuguesa.