Um consulente do Ciberdúvidas assistia pela televisão à última reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas e ficou chocado com o facto de o representante de Angola ter feito a sua intervenção em Inglês. Com a agravante, para ele, de os representantes do México, do Chile, de Espanha, da Rússia, de França, da Guiné-Conacri, da China, do Iraque, dos Estados Unidos e do Reino Unido haverem feito as suas intervenções nas respectivas/respetivas línguas nacionais. Facto/fato estranho, mas… perfeitamente normal.
Como outro consulente logo se apressou em esclarecer, o Português não é língua de trabalho das Nações Unidas, ao contrário do Árabe, do Chinês, do Espanhol, do Francês, do Inglês e do Russo. Portanto, o diplomata angolano só poderia intervir numa língua de trabalho das Nações Unidas. Escolheu o Inglês. Poderia tê-lo feito em Chinês. Certamente não saberá falar Chinês.
A questão de fundo a reflectir/refletir é a seguinte: porque é que o Português não é língua de trabalho nas Nações Unidas? Porque os critérios de selecção/seleção foram de natureza essencialmente política, não reflectindo/refletindo a importância das línguas no contexto do mundo de hoje. As Nações Unidas e o Conselho de Segurança surgem na sequência da geopolítica saída da II Guerra Mundial. Os seus vencedores, a China, os Estados Unidos, a França, o Reino Unido e a antiga URSS, hoje Rússia, integraram, como membros permanentes, o Conselho de Segurança. As suas línguas, isto é, o idioma de cada um dos vencedores, prevaleceram como as línguas de trabalho na então nascente ONU. O Alemão e o Japonês nunca poderiam ter sido escolhidas. Estes países – espanto dos espantos – ainda hoje são designados como países inimigos pela Carta das Nações Unidas…
A par das línguas dos países vencedores do último grande conflito mundial, foram ainda escolhidos o Espanhol e o Árabe. É sempre bom ter países árabes no leque de países amigos. O petróleo era essencial para alimentar as indústrias norte-americanas e europeias/européias e, por outro lado, era de bom tom dar voz aos países emergentes do chamado Terceiro Mundo. O Árabe era língua de uma série de países nestas circunstâncias. Quanto ao Espanhol pesou a sua própria relevância e, também, o empenho nesse sentido das autoridades de Madrid.
Este cenário geopolítico e linguístico está ultrapassado. As línguas, hoje, têm de valer pelo que representam no mundo da ciência, da cultura, da arte e da economia. E, não restam quaisquer dúvidas, a Língua Portuguesa tem hoje mais expressão nestes domínios do que algumas línguas de trabalho das Nações Unidas.
Uma pergunta final. Que estratégias têm os Estados lusófonos, a começar pelo português, e o próprio Instituto Internacional da Língua Portuguesa, para promoverem o Português no seio das organizações internacionais?