Sempre houve, desde o século XVI até ao realismo, grande amor à língua, à sua pureza e ao seu enriquecimento; abundam os pleitos sobre estilo e muitos foram os autores que fizeram declarações enfáticas de sacrificar a esse culto da sua linguagem a maior divulgação que lhes daria o uso da castelhana, entre eles António Ferreira e Frei Bernardo de Brito, como também houve os que souberam tornar-se clássicos tanto na portuguesa como na castelhana. Mas esses desvelos visavam à criação de um estilo uniforme e impessoal, o bom estilo literário ensinado nas retóricas, o que se acordava com a corrente concepção estética da Beleza única dos antigos e o processo único da imitação destes para a atingir. Os carinhos do artista que visa a criar um estilo seu e que à expressão mais do que à pureza tende, que rebusca, emenda e aperfeiçoa o vestido da ideia, na certeza de que lhe dará relevo maior, são excepções, durante a era clássica, com Jacinto Freire de Andrade, Manuel Bernardes, Padre António Vieira, Frei Luís de Sousa, D. Francisco Manuel de Melo e Matias Aires. O culto da língua, como instrumento de arte, a criação dos estilos individuais, só podia surgir no século XIX, com a invasão da personalidade do autor na literatura, com o romantismo. E ainda, em pleno século XIX, a par de criadores de estilo, tão originais como Garrett e Herculano, coexistitu Castilho, último abencerragem do estilo clássico, único, impessoal, e improgressivo.
dos "Estudos de Literatura", terceira série, Lisboa, 1891, pág. 240 e ss. In "Paladinos da Linguagem", volume II.