A interjeição popular «Ala» - significando «vai-te embora», «eia! vamos! anda!» -, para além de surgir sozinha, aparece também a introduzir outras expressões populares bastante conhecidas.
Embora faça parte do nosso léxico actual, essa interjeição é muito antiga, pois Gil Vicente usa-a - na expressão «Ala, ala!» - no Auto da Barca do Purgatório, mais propriamente na fala do Diabo.
E, se formos procurar a sua origem, verificamos que remete para o verbo alar (dar asas), hoje em desuso, aqui usado no imperativo, o que corresponde ao sentido com que a empregamos hoje.
Reparemos no significado das expressões populares que encontrámos em vários dicionários:
«Ala, que se faz tarde!» - «ir-se embora a tempo!» (Guilherme Augusto Simões, Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, Lisboa, Dom Quixote, 1993), surgindo, assim, como «forma de despedida» (Orlando Neves, Dicionário de Frases Feitas, Porto, Lello, 1991)
«Toma cada um a sua direcção e ala, nem te vi nem te conheço» - «Toca a fugir!» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa de Cândido de Figueiredo, 1996)
«Ala milhano!» - «Fuja! Vá-se embora!» (Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, ob. cit.)
«Ala arriba!» - «grito dos pescadores ao puxarem o barco da água para o areal» (Novo Dicionário Compacto de Língua Portuguesa de António de Morais e Silva)
E, decerto, que ainda há tantas outras menos conhecidas, como é o caso da expressão apresentada pelo consulente - «Ala, que é Cardoso!» -, cuja origem deve estar ligada a uma situação em que um certo Cardoso teve alguma atitude reprovável. Tal expressão parece transmitir uma mensagem de alerta, uma necessidade de que será prudente ir(em)-se embora, porque estão na companhia de alguém que não é bem-vindo, que se deve evitar.
Mas, apesar de ter como base o significado da interjeição «ala», que aponta para a ideia de fuga, de desejo de partida, não encontrei nenhum registo que evidenciasse que o nome próprio Cardoso tivesse qualquer marca negativa. Esta é uma leitura que foi feita a partir da carga semântica associada à interjeição e, também, à expressão «que é...», que parece evidenciar a causa (que é... = porque é).
Cf. Em relação a «Ala, que é cardoso!»
N. E. (19/09/2025) – Agradecemos ao consulente Manuel Campos Vilhena a seguinte achega: «Gostaria de dar conta de que tal expressão, muito utilizada na Linha de Sintra (distrito de Lisboa), deriva na certa do grito de "Olhó Cardoso!", que um rapaz de nome Norberto proferia amiúde quando via alguém atravessar à frente de um comboio em andamento na estação de Queluz-Belas. Ocorria isto nas últimas décadas do séc. XX, e o nome Cardoso referia-se ao dono da agência funerária sediada perto da referida estação.»