Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Na frase «Saíram todos menos ela», a palavra menos pode ser considerada um advérbio de exclusão?

Obrigada.

Resposta:

No contexto apresentado, menos é substituível por exceto, que ocorre num exemplo do Dicionário Terminológico (B. 3 Classes de Palavras), ilustrativo dos advérbios de inclusão e exclusão. Dado que essa substituição não introduz diferença funcional nem semântica – como exceto, menos modifica um constituinte, «contribuindo com informação sobre [...] a sua participação ou não num determinado conjunto» (idem) –, na perspetiva do DT, impõe-se, portanto, classificar menos como advérbio de exclusão tendo em conta a frase apresentada (ver também Domínios – Gramática da Língua Portuguesa – 3.º Ciclo e Ensino Secundário, Lisboa, Plátano Editora, 2011, pág. 146).

Acrescente-se que, mesmo à luz da terminologia anterior ao aparecimento do DT, ou seja, no quadro da Nomenclatura Gramatical Portuguesa de 1967, se considerava que menos era, em certos contextos, um advérbio com valor de exclusão, sinónimo de exceto, conforme se pode verificar, por exemplo, no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, que também apresenta as seguintes abonações: ««Ele era tudo menos alegre»; «Esperava tudo menos sair».

Pergunta:

Seguindo o [Acordo Ortográfico de 1991], o correto seria "pronta-entrega", ou "pronta entrega"? Não encontrei referências tão confiáveis quanto o Ciberdúvidas.

Grato.

Resposta:

Deve escrever pronta-entrega, cuja grafia não foi alterada pelo novo acordo – cf. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras, iDicionário Aulete e Dicionário Unesp do Português Contemporâneo (São Paulo, 2004). Neste último dicionário, pronta-entrega significa:

«1. confecção de roupas [...];

2. entrega imediata [...];

3. sistema de entrega imediata de roupas estocadas [...];

4. loja que vende esses produtos, nesse sistema [...].»

Pergunta:

Tenho aqui uma frase: «E Lisboa é de longe menos poluída do que a maior parte das capitais europeias.»

Não percebi bem o significado de «de longe» aqui.

Quer dizer «muito menos poluída do que outras»?

E mais uma frase: «Esta viagem ficou, de longe, mais barata.»

Que significa?

Muito obrigada!

Resposta:

Com construções comparativas, «de longe» tem sentido figurado e significa (Dicionário Houaiss): «folgadamente, com grande margem de diferença sobre as demais pessoas ou coisas; Ex.: é, de longe, a melhor música composta para o festival.»

Pergunta:

Parabéns pelo site! É uma iniciativa muito útil e esclarecedora!

Gostaria de saber a regência correta de atenção, no caso da expressão «prestar atenção». Presta-se atenção «a algo» ou «em algo»? Exemplos:

a) «(...) se vocês prestarem atenção no/ao que eu digo, se fizerem o que é certo e se guardarem os meus mandamentos, eu não os castigarei com nenhuma das doenças que mandei contra os egípcios»;

b) «Povo de Israel, preste atenção nas leis e nos mandamentos/às leis e aos mandamentos que estou dando a vocês hoje»;

c) «Venham cá e prestem atenção naquilo/àquilo que o Senhor, nosso Deus, vai dizer.»

Muito obrigada!

Resposta:

Em nome do Ciberdúvidas, agradeço as suas primeiras palavras.

Quanto à expressão «prestar atenção», as preposições usadas na regência são a ou em, conforme se descreve no Dicionário Houaiss:

«prestar atenção a ou em. olhar, ouvir, sentir (algo) com atenção aumentada, concentrada. Ex.: preste atenção ao (ou no) que ele está dizendo.»

Refira-se que no português de Portugal se prefere a preposição a com esta locução (pesquisar a expressão «prestar atenção» no Corpus do Português, de Mike Davies e Michael Ferreira).

Pergunta:

Gostava de saber a origem/etimologia da palavra solar (casa nobre).

Muito obrigada.

Resposta:

Usado nas aceções de «moradia de família nobre ou importante» e «moradia de grandes dimensões, geralmente de arquitetura requintada» (cf. solar³, Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, na Infopédia), o substantivo solar surgiu como derivado de solo, «chão, terra», palavra à qual se associou o sufixo formador de adjetivos -ar (Dicionário Houaiss; ver também José Pedro Machado, Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa). Sobre este sufixo, lê-se também no Dicionário Houaiss (abreviaturas desenvolvidas):

«do latim -aris, e, alternativo do sufixo -al do latim -ālis, e; é de notar, para estes casos, que a opção linguageira por -ar adjetival, quase que sistematicamente, ocorre em palavras cujo radical encerra l, numa tendência clara à dissimulação de dois ll; a série de adjetivos, sempre de dois gêneros, compreende um bom número de palavras que se substantivam, ocasional ou quase regularmente; nesses casos, o gênero da palavra substantivada é quase sistematicamente função de silepse, subentendido, assim, o gênero do substantivo. pensado: os (elementos) preliminares, as (noções) preliminares, a (decisão, sentença) liminar, o (despacho) liminar etc. [...]»

Por outras palavras e cingindo a discussão a solar, parece que esta teve inicialmente valor adjetival, designando o que era relativo ao solo que era propriedade de uma família. Mais tarde, verificou-se a sua substantivação («o solar»), acompanhada de um processo de restrição semântica que acabou por tornar solar