Para facilitar a análise da situação, retomamos não o título mas alguns versos do final da canção de Caetano Veloso, referida pelo consulente:
(1) «O quereres e o estares sempre a fim
Do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal»
De acordo com o contexto frásico em que surge a forma o quereres, referida na questão, é possível perceber que estamos não perante uma forma verbal mas perante um nome/substantivo. Este é caso de conversão (também designado derivação imprópria em algumas gramáticas), um processo de formação de palavras que consiste na mudança de classe das palavras sem qualquer alteração formal. No caso em apreço, operou-se uma mudança da forma verbal quereres para um nome/substantivo [o] quereres. Quando ocorre um processo de conversão, uma das suas particularidades está relacionada com o facto de a classe de chegada da palavra determinar as suas novas possibilidades de concordância. Assim, o facto de o verbo se converter em nome/substantivo determina a sua possibilidade de ser determinado pelo artigo definido, característica que é típica da classe do nome/substantivo. Também por esta razão o quereres [e o estares] desempenha a função de sujeito na frase, que simplificamos para melhor compreensão:
(2) «O quereres faz-me querer-te bem». [Isto faz-me querer-te bem.]
Por esta razão, a aceção de o quereres é sentida como semelhante à de o facto de quereres.
Situação diferente encontramos nos versos seguintes da mesma canção:
(3) «Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal»
onde encontramos a forma verbal quereres, flexionada no infinitivo pessoal como processo de identificar o sujeito que não se encontra expresso na frase (tu), uma das situações em que se justifica o recurso ao infinitivo pessoal.