É bem verdade que, apesar de ser frequentemente usada hoje em dia em Portugal, a forma de tratamento você gera reacções contraditórias, porque tem interpretações distintas. Aliás, é sintomático o modo como a expressão que está na sua origem, vossa mercê, é definida no Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa: «forma de tratamento dada às pessoas que não tinham direito a senhoria; forma de tratamento de cortesia dado [sic] a pessoas de cerimónia».
Ora, por um lado, certas pessoas usam-na para interpelar cerimoniosamente alguém que desconhecem ou que conhecem mal (para evitar tratar essas pessoas por tu) e também para se dirigirem a alguém a quem devem respeito, por exemplo os pais (ex.: «Mãe, você quer ir comigo?»). É nesse sentido que muitos alunos se dirigem aos professores usando o pronome você, a maior parte das vezes porque, no respectivo seio familiar, aprenderam que essa era a forma mais adequada para tratarem alguém com cerimónia.
Por outro lado, há quem não aceite ser interpelado por meio do pronome você, que está associado, como atestam os dicionários, ao tratamento de pessoas «de igual para igual ou de superior para inferior, a nível social, hierárquico ou etário» (Dic. da Academia das Ciências de Lisboa). Para quem encara o tratamento por você como uma falta de respeito para com a pessoa desconhecida (ou hierarquicamente superior) que se pretende interpelar, este pronome implica demasiada confiança e deveria ser substituído por «o/a senhor(a)», «o/a chefe/patrão, etc.» ou, no contexto escolar, «o/a professor(a)».
Tendo em conta as contradições aqui expostas e evidenciadas na própria pergunta (o professor diz ao aluno que usar você é grosseiro, mas este, em casa, ouve a entrevistadora interpelar uma pessoa importante usando você), sugiro que haja compreensão e alguma brandura na eventual condenação desse tratamento por parte de alunos para com os professores.